PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO DA CHAPADA DIAMANTINA: IDENTIDADE E PRESERVAÇÃO

Autores

  • SAMMY HELLEN FALCÃO NOVAES falcaosammy@gmail.com
    Instituto Federal da Bahia – IFBA, campus de Seabra
  • MARIA HELOÍSA SANTOS SOUZA hello_ssouza123@live.com
    Instituto Federal da Bahia – IFBA, campus de Seabra
  • JEOVANGELA MATOS ROSA RIBEIRO jeovangelarosa@ifba.edu.br
    Instituto Federal, Ciência e Tecnologia da Bahia, Campus Seabra.
  • JOYCE CRISTINA DA SILVA HOLANDA joycecristina@ifba.edu.br
    Instituto Federal da Bahia, Campus Seabra

Resumo

A Chapada Diamantina é conhecida por ser um vasto território no qual se encontram uma grande
biodiversidade e belezas cênicas naturais e histórico-culturais procuradas por turistas de todo o mundo. Além
disso, o local também abriga um amplo acervo arqueológico, que evidencia também a diversidade de povos
autóctones que povoaram a região, o qual ainda é em partes desconhecido e desprotegido pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Assim, a demanda pelo estudo e defesa do patrimônio
arqueológico surgiu de estudantes de meio ambiente que identificaram pinturas rupestres nos sítios do Gonsalo,
pertencente à comunidade de Santo André, Brotas de Macaúbas- Ba; e da Pinta dos Tapuias tocante ao povoado
de Canarina, Barra do Mendes-Ba. Tais comunidades pertencem a uma região caracterizada como Chapada
Velha1, a qual possui um vasto acervo cultural, tanto do período pré-colonial, quanto do pós-colonial. Mesmo que 

o sítio do Gonsalo não esteja geograficamente dentro da área da Chapada Velha, considerou-se durante a pesquisa
este como extensão do território, pois a distância entre os sítios é reduzida e a vegetação em torno destes é similar2
.
Da mesma maneira, qualificou-se os sítios como parte integrante do entorno da Chapada Diamantina, posto que
os grupos que povoaram a região que hoje se compreende a Chapada Diamantina podem também ter povoado a
plaga referente à Chapada Velha. Assim como a Chapada Diamantina a Chapada Velha é caracterizada como uma
região de planaltos, grutas e veios de água; tais características podem justificar o porquê deste território ter sido
habitado por diversos grupos originários: possibilita uma vasta visão das partes de depressões existentes no local,
o que pode ter sido usado como estratégia para visualizar a aproximação de outros grupos e animais, pontos de
água e locais para a captação de alimento. De tal maneira, as pinturas rupestres tiveram sua importância observada
não apenas pela estética, mas por ser um marcador do desenvolvimento cognitivo humano, já que é um sistema
gráfico que representa pensamentos, símbolos, abstrações e parte da subjetividade do homem (PESSIS, 1994).
Entretanto, apesar de toda a relevância citada, os registros rupestres se encontram em situação de abandono e com
integridade comprometida. A partir de discussões realizadas no grupo de estudos arqueológicos do IFBA campus
Seabra, pôde-se associar esse fato à estigmatização dos costumes e da identidade indígena durante os séculos que
perduraram a invasão portuguesa em parte das terras de Abya Yala, denominação dos povos kuna para território
da América Latina anterior à colonização (LISBOA, 2014). Isso ocorre porque na memória coletiva de uma
porção dos brasileiros foram associados valores negativos à cultura dos originários, como o atraso e a selvageria,
fator que juntamente com a aculturação, fez com que deixassem de se reconhecer como parte integrante dos

autóctones. Com tamanha intensidade, formou-se uma lacuna histórica entre os processos antrópicos pré-
coloniais e o de formação das comunidades, fator que faz com que diversos territórios dotados de patrimônios

culturais e arqueológicos no Brasil ficassem desprotegidos, pois apesar de serem habitados por pessoas que
possuam costumes advindos dos indígenas, não se têm a identificação delas como tal, fator que inviabiliza as
demarcações e os torna vulneráveis aos impactos ambientais e agentes erosivos naturais. Assim, observou- se que
justamente o espaço mais depredado foi o Gonsalo, este que não possui relação de pertencimento com as pessoas
que habitam nas proximidades e nem está inserido no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos do IPHAN.
Ademais, as duas comunidades não possuem acesso à educação ambiental e patrimonial que proporcione a
construção coletiva de valores e conhecimentos sobre ancestralidade e preservação. É importante ressaltar que a
IV Semana Indígena do IFBA- Campus Seabra exerceu papel importante na identificação da problemática visto que fomentou a preocupação com a importância do legado dos povos originários, e juntamente com as noções de
preservação proporcionadas pela instituição, foi instigada a produção do artigo que se fundamenta no patrimônio
arqueológico inserido na categoria meio ambiente cultural, isto é, o espaço antropizado e dotado de valores
simbólicos, pontuando-se que os legados da ação humana são características intrínsecas ao meio ambiente, e que
este enquanto direito fundamental deve ser assegurado e protegido pelos órgãos competentes e pela sociedade
civil. Nesse contexto, buscou-se utilizar as pinturas com o viés arqueológico, visto que foram consideradas como
registros de processos sócio históricos dos autóctones e identificou-se as tradições as quais os pintores fizeram
parte, isto é, os horizontes culturais, observados através das técnicas e do estilo gráfico de cada pintura. Assim,
pôde-se observar que alguns elementos das pinturas são referentes à Tradição Agreste, a qual caracteriza-se pela
apresentação de figuras humanas, de animais, e de grafismos puros, estes que de acordo com Anne Marie Pessis
são círculos, espirais, quadrados, linhas, e outros elementos, denominados pela cultura ocidental como
geométricos. Além disso, os principais zoomorfos encontrados são os sáurios, répteis comuns da Caatinga. Tal
tradição também se caracteriza por possuir traços grosseiros, sem muito refinamento, com figuras preenchidas e
dimensões significativas, as quais sugerem pouco ou nenhum movimento. De acordo com José, as pinturas da
Tradição Agreste foram feitas em tinta vermelho escuro e possuem tal denominação em virtude dos primeiros
grafismos de tal estilo terem sido encontrados na região agreste de Pernambuco e da Paraíba. Ademais, de acordo
com datações, foram feitas por povos que viveram até 11.000 B.P. Também foram encontrados componentes da
Tradição Nordeste, esta que é encontrada sobretudo na região Nordeste do Brasil, e é uma das mais antigas
representações rupestres do continente sul-americano, datada de 12.000 anos B.P. Ademais, é caracterizada por
figuras de antropomorfos que apresentam grande riqueza de detalhes, sempre acompanhadas de adornos e
atributos, podendo significar hierarquias sociais ou tribos distintas. Além disso, nas pinturas com a presença de
antropomorfos, estes aparentam estar em movimento. É frequente nas representações da tradição aparecer cenas
de luta, caça, dança e sexo, além de diversas cenas que podem, ou não, caracterizar ritos cerimoniais sem um
significado conhecido. Foram encontrados em ambos os sítios elementos que se enquadram nas tradições agreste
e nordeste, e essa variedade de traços e pinturas que mostram que a Chapada Diamantina não possui apenas a
fauna e flora diversos, mas uma grande pluralidade étnica e cultural dos povos que habitaram a região em períodos
distintos da história humana. Tal multiplicidade de patrimônios naturais e antrópicos da chapada deve ser
preservada e desta maneira, espera-se cadastrar o Sítio do Gonsalo, da comunidade de Santo André, ao Cadastro
Nacional de Sítios Arqueológicos do IPHAN, fator que assegurará seu reconhecimento e proteção
institucionalizada. Assim, é expressa a indispensabilidade da produção de materiais didáticos e de divulgação científica sobre ambos os sítios, a fim de que haja a valorização e o reconhecimento do patrimônio público e
cultural e que sejam fortalecidas as relações entre os registros rupestres à comunidade que estão inseridos. A partir
de evidências, constata-se também que preservar o patrimônio arqueológico é fundamental para a investigação
científica em virtude da garantia da existência dos registros que possibilitam a ampliação de estudos e da
compreensão sobre os povos originários e suas formas de organização, adaptação, rotas de povoamento, e as
demais evidências de suas atividades. Por fim, pondera-se que ter o patrimônio arqueológico reconhecido pela
comunidade científica e pelos grupos tradicionais é fundamental para que o desenvolvimento tecnológico e a
defesa ambiental deixem de ser paradoxos, visto que os estudos sobre os registros sociohistóricos serão
concomitantes com a preservação do entorno o qual as pinturas estão inseridas e, consequentemente, com a
preservação da Chapada Diamantina. Apenas assim poderão ser desenvolvidas ações efetivas que irão possibilitar
a proteção do meio ambiente cultural em questão.

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Publicado

2021-08-27

Como Citar

NOVAES, S. H. F., SOUZA, M. H. S., RIBEIRO, J. M. R., & HOLANDA, J. C. D. S. (2021). PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO DA CHAPADA DIAMANTINA: IDENTIDADE E PRESERVAÇÃO. Cadernos Macambira, 4(2), 20–23. Recuperado de http://revista.lapprudes.net/index.php/CM/article/view/359