ACESSO À ÁGUA NO BRASIL: POR QUE O PAÍS DAS MAIORES RESERVAS HÍDRICAS SOFRE COM A ESCASSEZ DA ÁGUA?

Autores

  • GYOVANNA NONATO MANFREDINI Centro Universitário Tiradentes

Resumo

O Brasil é excepcionalmente favorecido em relação às suas fontes hídricas, possuindo a maior
quantidade de água doce do planeta, tendo 12% do total existente no mesmo, e sendo, inclusive, mais abundante
do que continentes inteiros como a Europa. À vista disso, o presente trabalho tem como finalidade analisar o
impacto da exploração predatória dos recursos hídricos, considerando o direito ao meio ambiente, bem como visa
avaliar as soluções aplicadas no Brasil para a gestão desses recursos, tendo em vista que, apesar das maiores
reservas de água do planeta estarem no território brasileiro, 16% da população nacional ainda sofre com total
carência de água, o que tende a aumentar. Para mais, destaca-se o acalorado debate sobre a forma heterogênea de
distribuição de água no país com maior concentração de água potável do globo. Segundo estudos da Universidade
Federal do Pará, o aquífero Alter do Chão, que é a maior reserva subterrânea de água doce do mundo e é capaz
de abastecer toda a população mundial até cem vezes, está no Brasil, mais especificamente, sob os estados do
Amapá, Pará e Amazonas, em uma área de 437 mil km2, sendo composto por 86 mil km2 de água doce. Não
obstante, ainda conta-se com o Aquífero Guarani, que tem uma área de 1,2 milhão de km2, com um volume que
chega a 45 km2. Ademais, apesar da disponibilidade ser a maior do mundo, a água própria para o consumo no
país não está distribuída igualitariamente, de forma que algumas regiões ainda convivem rotineiramente com total
falta de água. Além disso, de acordo com dados levantados pelo Instituto Trata Brasil, a Amazônia, que tem a
menor densidade demográfica do país, dispõe de 80% do total da água superficial, enquanto o Sudeste, a região
mais povoada do país, dispõe de apenas 6% do recurso. Assim, entende-se como principal motivo para o
surgimento da problemática o crescimento desordenado de pequenos centros onde houve rapidamente grande
concentração de pessoas em um único lugar, culminando então no fenômeno denominado “Inchaço Urbano”,
ensejando uma ineficiência no fenômeno da urbanização, pois o processo de planejamento e reestruturação não
acompanhou o crescimento da quantidade de pessoas que chegavam para residir nesses locais, uma vez que não
houve qualquer planejamento para desenvolvimento sustentável dessas cidades. De mais a mais, a ONU estabeleceu que “o acesso às fontes hídricas será a causa número um de guerras até 2030”, trazendo como
consequência cerca de 100 milhões de refugiados nos próximos 50 anos. Assim, torna-se cada vez mais evidente
o destaque do tema nos âmbitos políticos atuais, o que se dá em razão de que já ocasionou conflitos nefastos em
regiões já bastante escassas do referido bem. Outrossim, o acesso à água pode ser entendido como desdobramento
do Direito à Vida, por ser imprescindível à existência do homem, sendo possível elevá-lo a classificação de direito
de primeira geração. Deste modo, embora a Constituição Federal do Brasil de 1988 não tenha de forma explícita
a água no rol de direitos fundamentais, trata-se essencialmente de um bem ambiental, parte da natureza; além
disso, o meio ambiente estando protegido constitucionalmente no caput do art. 225 da referida Carta Magna, que
dispõe que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida. Para mais, há outros direitos implícitos como o direito à vida e à saúde, bem como o
princípio fundamental de dignidade da pessoa humana, que respaldam tal analogia. Do ponto de vista
internacional, cita-se também a Declaração de Direitos Humanos de 1948, que em seu artigo 25 - assim como os
artigos 11 e 12 do Pacto dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais - faz menção indireta sobre o direito à vida
e à saúde sob um entendimento amplo. Destarte, internamente doutrinadores clássicos considerarem a questão
ambiental um direito Fundamental, a exemplo de Paulo Bonavides e Celso Antônio de Mello, contando inclusive
com jurisprudência do Supremo Tribunal Federal também favorável ao entendimento. Sendo assim, tornando-se
inevitavelmente um tópico relevante para a sociedade civil organizada, Estados, governos, sujeitos de direito
público e até mesmo para a iniciativa privada, o Direito também preocupou-se em alcançar a tutela desse direito,
já que trata-se da situação de contaminação e poluição massiva das reservas de água potável, esgotamento dos
recursos naturais do planeta, destruição da camada de ozônio, erosão de solo, assoreamento de rios, dentre outras
mazelas oriundas da devastação do patrimônio ecológico. Neste ínterim, mais de 40 países europeus buscam
garantir o direito à água através de medidas como a reestatização dos serviços, pois as experiências de
privatização mostraram-se inefetivas e maléficas para a população de modo geral. Porém, por outro viés, em 2016
o Brasil foi na contramão das experiências mundiais e através da medida provisória 727, que mais tarde no mesmo
ano tornou-se a lei 13.334/2016, instituiu o Programa de Parceria de Investimentos (PPI), regulamentando a
privatização e concessão de mais de 30 ramos, incluindo saneamento básico, mineração e energia. De acordo com
especialistas, é alarmante que o Aquífero Guarani, que localiza-se numa área de 1,1 milhão de quilômetros
cúbicos, representando um oitavo da área total do Brasil, tenha sido privatizado por interesses capitalistas que
fomentam a exploração predatória de um recurso finito e escasso visando unicamente o lucro de uma pequena
minoria que através das multinacionais comercializam a água. Concludentemente, a partir das ideias expostas,
entende-se que a ideia de melhoria nos serviços através da privatização da água no Brasil é o resultado de más gestões. Sendo assim, a perspectiva de solução está em trazer especialistas competentes para os órgãos
responsáveis para distribuição, que sobretudo intencionem o interesse público em face aos interesses mercantis,
por entenderem o referido direito como fundamental e inalienável. Além disso, buscar efetivar os fundamentos
de gestão descentralizada e participativa da já existente Política Nacional de Recursos Hídricos, tornando a gestão
próxima aos comitês das bacias, não deixando a fiscalização sendo realizada apenas em nível institucional
estadual ou federal, mas também sendo realizada pelos usuários e organizações civis, efetivando assim os valores
fundamentais que o referido dispositivo trouxe.

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Publicado

2021-08-27

Como Citar

MANFREDINI, G. N. (2021). ACESSO À ÁGUA NO BRASIL: POR QUE O PAÍS DAS MAIORES RESERVAS HÍDRICAS SOFRE COM A ESCASSEZ DA ÁGUA?. Cadernos Macambira, 4(2), 42–44. Recuperado de https://revista.lapprudes.net/CM/article/view/365