PERCURSOS FORMATIVOS NA COMUNIDADE QUILOMBOLA DE LAGOA GRANDE – FEIRA DE SANTANA (BA)
Resumen
Esse trabalho emerge na Comunidade rural negra e Quilombola Lagoa Grande, localizada no município
de Feira de Santana, Bahia, através do Projeto Universal Tecnologia Social, Agroecologia e Trabalho Associado
no Território Portal Do sertão), assistido pelo PAAE e Projeto Pibic –EM. Esse Projeto consiste em realizar
pesquisas sobre as Comunidades Remanescentes de Quilombos localizadas em Feira de Santana, denominadas
de Matinha dos Pretos, Candeal II e Lagoa Grande, que legalmente em direito constitucional pertinente, pleiteiam
a titulação dos territórios que historicamente reconhecem como seus. Tal direito é previsto no artigo n.o 68 do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988, sob o enunciado: Aos
remanescentes das comunidades de quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos. Assim, tais comunidades quilombolas estão no
centro do debate das territorialidades e de luta pela terra e bem viver.
Esse trabalho visa a elaboração de um Relatório e registros sobre as Comunidades que possam ser
utilizados pelas mesmas como documentos políticos e de resguardo de memória coletiva. É um trabalho que visa
uma centralização dos/as sujeitos/as quilombolas como protagonistas3
e como vozes na composição deste lugar,
território quilombola. Para isso, tomamos como ponto de partida a redução da escala de observação para
considerar essas Comunidades e nesse relato, a Comunidade de Lagoa Grande como um Quilombo no século
XXI. Ao considerar o princípio de redução de escala de observação ao estudo sobre o protagonismo quilombola,
procuramos destacar os/as sujeitos/as nos diversos meios sociais, observando as redes de relações que foram
tecendo no seu espaço de experiências próximas, bem como as relações que estabeleceram com outros âmbitos
de circulação, vivenciando experiências individuais e coletivas através de investimento de táticas para sua
inserção social e política e da própria Comunidade.
As vivências no andamento dessa pesquisa indicou a existência de um grupo de sujeitos/as negros/as
interligados por ações, discursos e lugares que permitem afirmar a existência de uma identidade coletiva agindo
politicamente, na articulação do acesso da Comunidade a todos os direitos assegurados por Lei para as
Comunidades Remanescentes, na tentativa de promover meios de inserção para os remanescentes de Quilombo. A partir dos relatos desses remanescentes quilombolas, o surgimento de Lagoa Grande enquanto Quilombo
começa quando três homens, que não se sabe se libertos ou escravizados chegaram no meio da noite na atual
região do Distrito de Maria Quitéria em Feira de Santana e começaram a capinar e ali fizeram morada, a partir
daí outros moradores foram chegando e fazendo morada, a comunidade foi crescendo ao poucos e para sobreviver
eles faziam uso de uma grande fonte natural de água, a Lagoa Grande que deu nome ao Quilombo. Com o passar do tempo as pessoas de fora começaram a notar a existência da Lagoa e começaram a
frequentar o local, trazendo consigo a contaminação da água, lixo, resolveram fazer uma prainha no lugar da
Lagoa, ou seja, um processo de capitalização da região Quilombola. Este processo resultou na seca da lagoa, viva
apenas no nome do Quilombo. A Lagoa Grande é uma Comunidade certificada, mas sem título de terra.
Atualmente, no Brasil, por conta das terras “tomadas” pelo Estado, a demora é de três a quatro anos para entregar
o certificado de remanescente de quilombo e consequentemente amplia a demora da posse de suas terras, foi o
que aconteceu no processo de certificação do Quilombo da Lagoa Grande em Feira de Santana, Bahia.
A necessidade de lutar contra o Estado, fazendeiros e grileiros e contra a especulação do território, seja
por parte das grandes empreiteiras ou do grande capital faz parte da constituição e preservação das dignidades
coletivas. A mais recente e atual, a rede de transmissão de alta tensão que ameaça passar no território de Matinha
dos Pretos, Comunidade vizinha de Lagoa Grande e que levou moradores e lideranças dessas Comunidades a se
unirem pela luta. A escola de Lagoa Grande, construída desde 2016 até então nunca foi concluída pela Prefeitura
Municipal, mas a Comunidade não deixa de ir a escola e mandar as juventudes para as universidades. A Comunidade não desistiu de investir em Tecnologias sociais como forma de luta e resistência. A
identidade quilombola, até início do século XX, um corpo estranho para estas comunidades rurais negras, passa
a significar uma complexa arma nesta batalha desigual pela sobrevivência material e simbólica. Estamos, diante
da incorporação de identidades que, em decorrência de eventos históricos, introduzem novas relações de
diferença, as quais passam a ser fundamentais na luta dessas populações negras pelo direito de continuar
ocupando e transmitindo às gerações vindouras o território conformado por diversas gerações de seus
antepassados. Um processo histórico de resistência, deflagrado no passado, é evocado para constituir resistência
hoje, praticamente como a reivindicação de uma continuidade desse mesmo processo. Vale ressaltar que
atualmente o conjunto das comunidades quilombolas feirenses estão em processo de luta e articulação coletiva
contra a urbanização dos quilombos por meio do PDDU aprovado no ano de 2018, o qual impactará diretamente
na qualidade de vida e nas vivências coletivas das referidas comunidades em estudo/vivência.